Coronel Pedro de Queiroz Lima
Este texto foi originalmente publicado na Revista Instituto do Ceará.
BOANERGES FACÓ
No ano de 1796, reinando em Portugal o Príncipe Regente Dom João, que, posteriormente, foi Dom João VI, em nome de sua mãe Dona Maria I, que enloquecera, governando no Brasil o Conde de Rezende, o Vice-Rei "taciturno e sinistro" no dizer de Rocha Pombo, e administrando na Capitania do Ceará o Capitão-mor Feo e Tôrres, nascia no sertão do Sitiá, na fazenda "Casa-Forte", uma criança do sexo masculino, que foi mais tarde o Coronel Pedro de Queiroz Lima. Era a fazenda de criar, às margens do rio Sitiá, de seus pais Capitão Antônio Pereira de Queiroz Lima e de Leandra Maria da Silva Barreira, que morreu em seguida a ter dado à luz o filho Pedro o oitavo e último dos filhos do casal.
Este menino desconheceu assim por completo os carinhos e afagos maternais. Conta-se que uma cabra boa de leite, de têtas flácidas, lhe dava, diretamente, abundante e substan- cioso alimento nos primeiros tempos de sua preciosa existência.
Nesse digno cearense se cruzaram, num magnífico caldeamento, em percentagem máxima o sangue luso e em percentagem mínima o sangue indígena, que lhe davam muitos ascendentes portuguêses e a sua quarta avó a índia Piaba de Cunhaú.
Em 1630, no domínio holandês em Recife, veio para ali, em plena mocidade (20 anos), o português Manuel Pereira de Queiroz, que ali trabalhara no comércio por 10 longos anos, mudando-se depois para Goiana, onde se fêz agricultor, no engenho "Jacaré", fazenda, que às margens do rio Goiana Grande, tinha uma légua de frente sôbre cinco de fundos. Em 1669, já grande proprietário e já com 59 anos de idade. contraiu matrimônio, na importante família Cavalcante de Vasconcelos, com Ângela Cavalcante de Vasconcelos, moça maior de 30 anos, filha do português Filipe de Brito Pereira da Rocha e de sua mulher Joaquina Cavalcante de Vasconcelos. Em 1671 nasceu a filha única do casal, Isabel Cavalcante Vasconcelos de Queiroz.
Em 1685 veio para o Brasil outro português, de nome Antônio Duarte de Queiroz, sobrinho de Manuel Pereira de Queiroz, e filho de Manuel de Queiroz da Silva, irmão de Manuel Pereira que êle deixara em Portugal ainda menino, e de sua mulher Jerônima Pinto Nogueira, portuguêses, pais de Duarte, que nunca vieram ao Brasil. Antônio Duarte procurou o tio em Recife em 1685, quando ali acabava de chegar. Soube que Manuel Pereira estava residindo em Goiana, no sítio "Jacaré", com depósitos de açúcar em Recife. Em face desta informação foi até Goiana, onde encontrou o tio já com 75 anos de idade, de vez que nascera em Portugal no ano de 1610.
Antônio Duarte, quando chegou no "Jacaré", já encontrou a prima Isabel casadoura, pois já tinha 14 anos. No ano de 1687 se constituiu ali o segundo casal Queiroz, ascen- dente do Coronel Pedro de Queiroz Lima. Antônio Duarte, apolítico, como fôra Manuel Pereira, a quem sucedeu nos trabalhos do canavial, viveu para a mulher e filhos e haveres herdados.
Ao tempo em que Antônio Duarte ali morava, conheceu o português Antônio Dias da Costa, que morava no Ceará, no baixo Jaguaribe, e que ia todos os anos às feiras de Goiana. onde vendia as suas cavalhadas e comprava fazendas, que trazia para São Bernardo do Jaguaribe, onde morava. Esse conhecimento, estabelecido entre os dois portuguêses, aproximou-os grandemente e se transformou numa grande amizade pelo resto da vida.
Antônio Dias induziu, mostrando-lhe as vantagens, a Antônio Duarte de Queiroz a se fazer fazendeiro no Ceará, onde o proprietário de "Jacaré" comprou as fazendas "Boa Vista" e "Barro Vermelho", respectivamente, às margens do Jaguaribe e do Banabuiú, fazendas que prosperaram e deram lucros aos dois amigos. Em face dessa prosperidade, Antônio Dias fêz com que o compatrício viesse com a família visitar as suas fazendas de criar no Ceará.
Antônio Duarte e dona Isabel, acompanhados de seus filhos menores Francisca, nascida em 1692, Bertoleza, nascida em 1694 e Antônio, nascido em 1696, vieram visitar as suas fazendas nos inícios de 1700. Esta longa viagem foi feita em costas de animais e por mãos de escravos. Dona Isabel, senhora acostumada ao conforto e bem-estar de suas boas e amplas habitações, achou a viagem penosa, sem fim, através daqueles sertões desabitados de homens civilizados mas cheios de índios e animais selvagens. Os dignos viajantes se aboletaram na fazenda mais próxima e mais confortável: "Boa Vista".
Esse passeio foi doloroso e fatídico, pois dentro de pouco tempo morreram Antônio Duarte e dona Isabel, assim como o bom amigo Antônio Dias da Costa, ficando os filhos menores ao desamparo. Morreram de febre de mau caráter. Dona Isabel, que não gostou do meio em que se encontrava, indispôs-se com o povo da terra, quando dizia que Deus a livrasse de ter filhos numa terra em que não havia quem pudesse ser padrinho de seus filhos, segundo nos informa Antônio Cirilo de Queiroz no seu livro "Genealogia da Família Queiroz". Moravam ali os pardos Britos a quem a "justiça" da época entregou as crianças, filhas do casal falecido. Os Britos se apoderaram dos haveres do casal Queiroz Vasconcelos, deixando aos menores apenas pedaços de terra no "Barro Vermelho", às margens do Banabuiú, e três escravos, embora os parentes brancos de dona Isabel, em Goiana, tenham feito pior que os Britos, por que ficaram com tudo que pertencia aos menores em Pernambuco. Apoderaram-se, e pessoas da família Cavalcante Vasconcelos ainda hoje possuem dêsses bens ali, razão por que Antônio Cirilo comenta na sua Genealogia escrita em 1892 que foram os bens furtados que mais permaneceram nas mãos dos próprios ladrões.
O ano de 1710 foi um ano de libertação para êsses órfãos sofredores. O menino Antônio Duarte de Queiroz Filho, que então já contava 14 anos de idade, resolve fugir de seus algozes, em busca dos parentes de sua mãe que êle ignorava serem piores do que os Britos de Jaguaribe. Saiu às escon- didas com o seu escravo do Jaguaribe mas não pôde fazer a travessia; adoeceu de febres em Pedra Lascada na Borborema, onde morreu e o escravo foi vendido em leilão em Paraíba.
No mesmo ano de 1710 vieram três portuguêses, sobrinhos de Antônio Duarte, filhos de três irmãos de Duarte: Inácio Pereira de Queiroz Lima, Vitoriano Nogueira de Quieroz e Joaquim Pinto de Queiroz. Os dois primeiros casaram-se, respectivamente, com as primas Francisca Cavalcante Vasconcelos de Queiroz e Bertoleza Cavalcante Vasconcelos de Queiroz, e o outro sem parenta para casar seguiu para o Rio Grande do Norte, onde casou na família Fernandes. Inácio Pereira de Queiroz Lima e dona Francisca Cavalcante Vasconcelos de Queiroz constituem o terceiro casal Queiroz, ascendente do Coronel Pedro de Queiroz Lima. O casamento realizou-se na capela de São João do Jaguaribe, onde se acham sepultados pais e sogros do novo casal.
Inácio Pereira e Dona Francisca foram morar na terra que lhes deixaram em "Barro Vermelho", às margens do Banabuiú, onde juntaram fortuna em terras, escravos e gados, e tiveram muitos filhos, entre êles o primeiro foi o Capitão Antônio Pereira de Queiroz. Ao tempo em que êste era rapaz, havia o casal Joaquim Correia de Araújo e Anastácia Maciel de Melo, filhos de portuguêses e brasileiros, casal morador na fazenda "Papagaio", no Apodi do Rio Grande do Norte, com filhos e filhas, sendo o mais velho a filha Helena de Oliveira Maciel. O seu pai, Joaquim Correia, sem consulta à mulher e à filha, prometera-a em casamento ao pardo rico da Capitania norte-riograndense, José Pereira da Silva Tubarão, morador em Paus de Ferros, homem que, além de mestiço, era mau, turbulento e rixoso. A mãe da futura ex-vítima Helena e mulher do Capitão Joaquim Correia, Dona Anastácia, com uma tática hábil, paciente e forte, venceu a vontade paterna, à antiga nestes assuntos, de modo que Joaquim Correia desfez o compromisso para com Tubarão e aceitou a proposta, anteriormente feita, por Inácio Pereira do "Barro Vermelho", de seu filho mais velho contrair matrimônio com a filha mais velha de Joaquim Correia. Assim constituiu-se o quarto casal Queiroz, ascendente do Coronel Pedro de Queiroz Lima: Antônio Pereira de Queiroz, o primogênito do casal do "Barro Vermelho", e Helena de Oliveira Maciel, a primogênita do casal do "Papagaio", do Apodi, no Rio Grande do Norte.
Não havendo parentesco entre os nubentes para as necessárias licenças, realizou-se logo o casamento de Antônio Pereira e Helena Maciel, que fixaram residência em "Barro Vermelho". Depois da morte dos pais, Inácio Pereira de Queiroz Lima e dona Francisca Cavalcante Vasconcelos de Queiroz, que foram sepultados na mesma capela em que estavam Antônio Duarte e sua mulher dona Isabel, pais e sogros de dona Francisca e Inácio Pereira, Antônio Pereira de Queiroz e sua mulher dona Helena se mudaram para o sertão do Sitiá, em Quixeramobim, hoje em Quixadá, onde se formou a poderosa e opulenta família Queiroz. Veio em companhia dêles o franciscano Miguel de Santa Teresa sôbre quem já escrevi longamente. (Vid. "Fastos do Ceará", in Rev. do Instituto do Ceará, Tomo LXVIII, Ano LXVIII, 1954, págs. 261-263.) Este frade que, segundo Antônio Cirilo, livro citado, estava licenciado pela ordem na colheita de escolas. viveu muitos anos em companhia de Antônio Pereira de Queiroz, em cuja fazenda tinha casa de residência e capela para os ofícios religiosos. Só voltou ao Convento da Bahia por morte de Antônio Pereira, que sepultou na então capela e hoje matriz de Quixeramobim. Frei Miguel batizou todos os filhos do amigo e deixou na família Queiroz a tradição de missas nos dias do Nascimento, da Paixão e da Ressurreição, ainda segundo Antônio Cirilo informa em seu livro.
Quando Antônio Pereira e dona Helena chegaram no Sitiá já moravam ali irmãos e cunhados de ambos. Uma vez no Sitiá, Antônio Pereira requereu e obteve terras no saco da Serra Azul, onde morou por muitos anos no sítio "Natividade", onde lhe nasceram os filhos. Depois de morar ali por cêrca de 12 anos mudou-se para a sua fazenda "Curralinho", no alto Sitiá, onde morreu em 10 de julho de 1774. deixando o seu filho primogênito Antônio Pereira de Queiroz Lima com 18 anos de idade, pois havia nascido em 1756.
Quando Antônio Pereira e dona Helena moravam no saco da Serra Azul, em Quixadá, no sítio "Natividade", viviam no Pirangi, na importante e vasta fazenda de criar "Quixinxé" o português Baltasar Lopes Barreira e sua mulher dona Antônia de Barbosa de Sá, bisneta da já mencionada, em páginas anteriores dêste trabalho, índia Piaba de Cunhaú, filha de Francisco Barbosa, antigo cacique de aldeia-Natal, no Rio Grande do Norte, e de sua mulher Rita da Estela. A índia Piaba, uma vez convertida e batizada, teve o nome cristão de Francisca Barbosa de Brito, de vez que era filha do ex-cacique Francisco Barbosa e casada com o português Custódio de Brito, de cujo consórcio nasceu Rita de Brito, que por sua vez se casou com o português Lourenço de Sá e Sousa. Entre os filhos do último casal nasceu a menina Maria Joana de Sá, que, quando núbil, contraiu matrimônio com o português Filipe Santiago da Silva, natural de Braga, no reino de Portugal, casal que fixou residência em Aquirás, primeira sede da Capitania do Siará-Grande. A filha do novo casal, de nome Antônia Barbosa de Sá, se casou com Baltasar Lopes Barreira, o dono da fazenda "Quixinxé", no Pirangi, de que já falei: Baltasar residia em Santa Cruz do Aracati, quando se casou com Antônia de Sá.
O filho mais velho do casal da Serra Azul Pereira de Queiroz e dona Helena de Oliveira Maciel nome Antônio Pereira de Queiroz Lima, casou-se em 1783 com Leandra Maria da Silva Barreira, filha do casal do "Quixinxé". Estes últimos, Antônio Pereira e Maria Leandra, são os pais do Coronel Pedro de Queiroz Lima, como se disse no começo dêste trabalho. Pelo exposto constata-se que Pedro de Queiroz, o antigo dono do sítio "Bom-Jardim", tinha nas suas veias máximo de sangue luso e mínimo de sangue indígena.
Os pais do Coronel Pedro de Queiroz Lima, como já consta dêste trabalho, fixaram residência na sua fazenda de criar, às margens do Sitiá, "Casa-Forte", onde tiveram muitos filhos, sendo Pedro de Queiroz o filho cadete.
Os moços da família Queiroz da nova geração mudaram completamente de idéias, quanto a seus antepassados apo- líticos, e tomaram parte ativa nos movimentos liberais do começo do século passado. Estiveram nas lutas contra os imperialistas nos movimentos de 1817 e 1824, de modo que a "Casa-Forte" se tornou um reduto de revolucionários, razão por que José Facó disse que ali se sonhou com a liberdade, como nas Astúrias com a independência da Espanha.
Antes dos movimentos liberais de "17" e "24" houve uma grande sêca no Ceará: 1790-1793, que obrigou a saída momen- tânea de muitos membros da família Queiroz para o litoral, onde passaram a crise climática, em terras de seu parente José Lopes Barreira, existentes em Aquirás. Entre êstes Queirozes vinha José de Queiroz Lima, irmão mais moço do dono da "Casa-Forte" e cunhado do mencionado José Lopes Barreira.
José de Queiroz Lima, que era tio legítimo de Pedro de Queiroz e que foi seu comandante no combate de Santa Rosa em que pereceu Tristão Gonçalves, a 31 de outubro de 1824, e onde ficaram ambos presos, após a sêca-grande, ficou resi- dindo em Aquirás e posteriormente em Cascavel. Ali se casou com dona Inácia Lopes da Costa, filha do Tenente-Capitão-mor de Aquirás, Francisco Xavier da Costa.
Na época do liberalismo revolucionário contrário ao imperialismo reacionário, Pedro de Queiroz era dos mais exaltados e dos mais destemidos. Por isso Esperidão de Queiroz (in "Antiga Família do Sertão", pág. 115) escreve: "As algemas e os grilhões apertados e grosseiros, com os trancos da viagem e continuação dos atritos, haviam-lhe produzido nos pulsos e nos tornozelos ferimentos circulares que, inflamados, deixaram brancas e indeléveis cicatrizes, gloriosos estigmas que se conservaram até o fim da sua longa e abençoada existência."
Pedro de Queiroz era revolucionário por amor à liberdade e ódio ao despotismo; era liberal por contrário ao imperialismo reinante que por política levava o adversário à fôrca ou ao pelotão de fuzilamento, mas era amante da ordem e do sossêgo público, tanto que por mais de uma vez pegou em armas na defesa do governo constituído e da tran- qüilidade pública.
Assim é que em 1832 pegou em armas a favor do govêrno abrilista do Presidente José Mariano contra o forte e deste- mido caudilho Joaquim Pinto Madeira que sonhou com a volta de Pedro I ao trono do Brasil, trono que, na abdicação, êle declarava deixar voluntàriamente...
Pedro de Queiroz acompanhou o presidente José Mariano contra Pinto Madeira e estêve acampado nas Lavras da Mangabeira na defesa do govêrno legal.
Em 1841, no segundo segundo governo do Senador José Martiniano de Alencar, houve um levante em Muxuré, em Quixeramobim, por parte dos imperialistas contra a política liberal do grande Presidente. É que o cônego Antônio Pinto de Mendonça, vigário de Quixeramobim, que fazia causa com o Senador Alencar, no seu primeiro govêrno (1834-1837) no Ceará, por preferência de Alencar pelo parente Padre Peixoto de Alencar para ocupar a igreja de Fortaleza, ficou contra Alencar em Quixeramobim. (vid. João Brígido, "Ceará Homens e Fatos", págs. 156-157)!
O Presidente Alencar contou com o apoio do Coronel Pedro de Queiroz, então comandante da Guarda Nacional de Cascavel para o restabelecimento da ordem em Muxuré. Pedro de Queiroz seguiu para ali, no comando do exército de pés-de-poeira, levando como seus oficiais João Aires da Silva Olival e Francisco Baltasar Ferreira Facó, o primeiro seu concunhado e o segundo seu futuro genro (Vid. Esperidião de Queiroz, obra citada, pág. 187.) Esperidião escreve: "Com a chegada dessa fôrça a Quixeramobim dispersou-se o ajun- tamento revolucionário de Muxuré."
Por isso José Facó escreve que o Coronel Pedro de Queiroz Lima era "ancião respeitável menos pela idade (êle escrevia em 1882) do que pelas virtudes e serviços prestados à causa pública, com brio, coragem e patriotismo"... (Vid. "Almanaque do Ceará", 1954, pág. 86. Revista do Instituto do Ceará, 1957, pág. 107.)
Jáder de Carvalho, escrevendo sôbre Pedro de Queiroz, salientou a sua vida de patriota e liberal, e pôs à mostra o fracasso de sua prisão no Serrote da Onça, na fazenda "Casa-Forte", onde escapou à louca e pertinaz perseguição imperialista, devido à lealdade e coragem do escravo Francisco, que preferiu morrer a revelar o "segrêdo quanto ao esconderijo".
Pedro de Queiroz, depois de longos sofrimentos, agravados pela crise climática (1825) e também ralado de saudades da noiva e futura espôsa, a prima Francisca Helena, resolveu descer o sertão em busca do litoral (Riacho Fundo, onde morava o tio e futuro sogro) nas proximidades de Cascavel. Uma noite, quando saciava a sêde numa cacimba, existente no leito sêco do rio, foi preso por uma das patrulhas imperialistas, que então infestavam os sertões do nordeste, onde se deram os movimentos revolucionários fracassados.
Pedro de Queiroz, uma vez em Cascavel, livre de processo e prisão por política, em virtude da anistia de 1826, contraiu matrimônio com a prima legítima Francisca Helena Rosa de Lima, filha de José de Queiroz, tio de Pedro de Queiroz. Pedro de Queiroz e sua mulher fixaram residência no sítio "Mirador", em terras do município de Aquirás, que no ano da graça de 1833, passaram a pertencer a Cascavel com a criação do novo município, desmembrado do Aquirás, e onde moraram até 1836. É que em 1835 comprou o sítio "Bom Jardim", dentro em o município de Beberibe, desde 1892, quando foi criada a nova comuna.
Pedro de Queiroz e Dona Francisca Helena, quando se mudaram para o "Bom-Jardim" em 1836, já moravam no sítio "Lucas" Baltasar Ferreira do Vale e sua mulher Catarina Teixeira. Pedro de Queiroz e Baltasar Ferreira eram primos legítimos pelo lado materno, filhos de filhas de Baltasar Lopes Barreira, dono da fazenda "Quixinxé", no Pirangi; e Francisca Helena, mulher de Pedro de Queiroz, e Catarina Teixeira, mulher de Baltasar Ferreira, eram também primas legítimas netas do Capitão-mor Francisco Xavier da Costa, e bisnetas de Baltasar Lopes Barreira do "Quixinxé", sendo Francisca Helena, filha de José de Queiroz, e Catarina Teixeira, filha do português Alexandre José Teixeira da Cunha Sampaio e de sua mulher Francisca Xavier da Costa, filha de Francisco Xavier da Costa.
Em face dêsse último parentesco entre os donos dos sítios "Bom-Jardim" e "Lucas" e da proximidade entre as duas pro- priedades rurais estabeleceu-se íntima amizade entre os dois felizes casais. Esta grande amizade e íntimo parentesco, que era da máxima importância na época, para o matrimônio, trouxeram novos casamentos em família entre moços do "Lucas" e do "Bom-Jardim". Assim é que a 25 de fevereiro de 1843 casaram-se Francisco Baltasar Ferreira Facó, quinto filho do casal do "Lucas", e Maria Adelaide de Queiroz, o filho primogênito do casal do "Bom-Jardim".
Dêsse novo enlace vieram muitos filhos, de que se criaram 10 homens e 4 mulheres. O quarto dos filhos foi Gustavo Francisco de Queiroz Facó, que a 13 de setembro de 1878 casou com a prima Maria Francisca da Cunha Araújo, e que, por sua vez, teve muitos filhos, entre os quais Péricles de Queiroz Facó, que é o sétimo filho do casal e atual doador do sítio "Bom-Jardim".
Pedro de Queiroz, mudando-se do "Mirador" para o "Bom-Jardim", conduziu o material da casa do "Mirador" e empregou-o na do "Bom-Jardim". Ali chegando, fêz uma plan- tação de coqueiros, dos quais o último veio a morrer sòmente na nossa última sêca (1958). Pedro de Queiroz viveu no "Bom-Jardim" por cêrca de 39, pois só de lá saiu no ano de 1875. Neste mesmo ano o seu neto Gustavo Facó, pai do doador Péricles Facó, tomou conta do sítio, já pertencente ao Coronel Raimundo José Pereira Leite, grande proprietário em Cascavel e primo do Coronel Pedro de Queiroz. Gustavo Facó ali ficou mediante módica renda ao novo proprietário do sítio. E Pedro de Queiroz mudou-se para a sua fazenda "Pedreira" no sertão do Sitiá.
Conta-se que Pedro de Queiroz, quando assinou a escritura de compra e venda do "Bom-Jardim", as lágrimas lhe rolaram pelas faces. É que êle fêz esta venda, porque a propriedade estava onerada e êle não pudera saldar compro- missos assumidos. O comprador facilitou que êle continuasse no sítio, mas Pedro de Queiroz não quis ficar na sua antiga propriedade. No momento Pedro de Queiroz disse ao comprador que ainda tinha um pedaço de terra no sertão para morar.
Gustavo Facó estêve no "Bom-Jardim", de 1875 a 30 de dezembro de 1907, dia de seu falecimento. Por morte de seu pai continuou a morar e a tomar conta do Bom-Jardim, Péricles Facó em companhia de sua mãe e irmãos. Péricles Facó, a 9 de janeiro de 1909 contraiu matrimônio com a sua prima legítima Adelaide Facó, mas de seu consórcio não lhe vieram filhos.
Péricles Facó no ano de 1918 comprou o "Bom-Jardim", com a devida licença da justiça, ao curador de Joaquim Tomás Pereira Leite, filho do Coronel Raimundo Leite, voltando assim a velha propriedade a pertencer a um des- cendente de Pedro de Queiroz, cuja memória êle tem sabido cultuar. Péricles Facó, como católico sincero e homem de bem, acaba de entregar de mão beijada a importante e valiosa propriedade rural, no corrente da "Casa Grande", aos Padres da Ordem do Sagrado Coração de Jesus, dos quais apenas exigiu, para que ali se mantenha na lembrança dos pósteros o nome limpo, honrado e respeitável de seu bisavô Pedro de Queiroz, que se fundasse na "Casa Grande" do sítio uma escola com o nome de um cidadão prestante à Justiça e à Pátria e que a doação jamais passasse a outra Ordem religiosa.
Como se constata, Pedro de Queiroz fêz a guerra contra o despotismo na defesa da liberdade, despotismo que mandava enforcar ou fuzilar Tiradentes, Tristão Gonçalves, Frei Caneca, Padre Roma, Padre Mororó e outros homens notáveis, abnegados e destemidos, que morriam por amor à Liberdade; mas trabalhou pela ordem, quando defendia o restabe- lecimento da paz, que o mesmo
mesmo despotismo procurava perturbar, como fêz na luta contra Pinto Madeira ou na contra Muxuré.
Simples e justa homenagem a quem em vida foi um denodado soldado da Liberdade contra o Despotismo e um impertérrito defensor da independência da Pátria contra a violência escravizadora.
NOTA: Este trabalho foi escrito por sugestão de Péricles Facó, doador de sitio «Bom-Jardim», no município de Beberibe, antiga propriedade de seu bisavõ Pedro de Queiroz, aos Padres da Ordem do Sagrado Coração de Jesus, para que êsses dignos Sacerdotes soubessem quem tinha sido em vida Pedro de Queiroz Lima.